Conheça 6 iniciativas de quem não está nada desanimado com a política

10 de junho de 2016 16:49

Grupo de pesquisadores reúne banco de projetos inovadores para aumentar o engajamento dos cidadãos com as políticas públicas na América Latina.

 

Foto: Nacho Doce/Reuters – 22.04.2012

Protesto em São Paulo

Manifestantes mascarados protestam em São Paulo

 

O Update – Laboratório de Inovação Política na América Latina lançou nesta quarta-feira (4) uma plataforma que reúne 700 “projetos, ações e ferramentas” de participação política de 20 países latino-americanos.

O que todos os projetos catalogados nesse grande banco de dados têm em comum é a ambição de promover “transparência, participação cidadã, cultura política, controle social, comunicação independente e governo 2.0.”. Esse último termo se refere ao uso de tecnologia para encurtar a distância entre o cidadão e seus governos.

Num cenário que muitos estudiosos chamam de “crise de representatividade”, com o modelo atual de democracia sendo questionado nas urnas ou nas ruas, o levantamento do Update acaba servindo como um termômetro do que tem surgido como alternativa fora do mainstream, fora do palco principal do sistema atual.

Da lista de 700 iniciativas, o Update selecionou a pedido do Nexo seis experiências.

Seis projetos inovadores

Partido de La Red (Argentina)

Utiliza o software livre Democracy OS que funciona por “consenso em massa”. Por meio dele, o Partido de La Red propõe que os candidatos do partido só votem de acordo com o que for decidido coletivamente pelos eleitores, que expressam sua opinião interagindo pela plataforma digital, numa experiência de tecnologia digital chamada de “democracia participativa vinculante”.

Chequeado (Argentina)

É uma plataforma de FactCheckin (verificação de discurso). Ela verifica os fatos e os discursos dos políticos para apurar se o que eles falam é de fato o que eles estão fazendo na prática. Isso se tornou tão importante no cenário político, que hoje está no Chile, Paraguai, Brasil (Projeto Truco, da Agência Pública, Lupa e Aos Fatos) e está se espalhando em vários outros países latinoamericanos.

Laboratórios de gestão pública e de participação (Brasil e México)

O Update diz ter percebido a tendência de os governos – sejam eles federais, municipais ou estaduais – buscarem espaços laboratoriais dentro das suas próprias instâncias. No Rio de Janeiro existe o Laboratório de Participação da Prefeitura do Rio (Lab Rio), que é um grupo dentro da gestão pública que está criando projetos, espaços de participação, de transparência e de inovação na cidade. Em Brasília, na Câmara dos Deputados, existe o Lab Hacker, na Cidade do México tem o Laboratorio para la Ciudad.

Ciudadano Inteligente (Chile)

É uma organização do Chile que é mais consolidada que trabalha promovendo a transparência e a participação cidadã por meio do uso inovador das tecnologias de informação, seja de Fact Checking (verificação de discurso), seja de mensurar as metas de governo ou fomento de tecnologia para novas eleições.

Tendência dos serviços digitais (Chile)

O Update encontrou uma tendência no uso de serviços digitais no governo do Chile. Eles possuem uma plataforma com cerca de 30 serviços digitais, seja de hospital, imposto de renda, polícia, mobilidade, entre outros. É uma forma de facilitar, pelo meio digital, o acesso aos serviços providos pelo Estado.

Colab (Brasil) e outras plataformas da América Latina

O aplicativo Colab descentraliza a fiscalização dos problemas das cidades. Nele é possível reportar problemas na rua, como uma luz queimada, um semáforo quebrado ou um buraco no asfalto. Você tira uma foto do buraco de forma georreferenciada e isso vai para uma base de dados. É uma inteligência coletiva da cidadania gerando relatórios e informações que podem subsidiar uma tomada de decisão do governo.

O Nexo apresentou cinco perguntas ao economista e ativista Caio Tendolini. Ele é filiado à Rede Sustentabilidade e foi um dos fundadores do Update, em 2014.

O fato de vocês terem 700 projetos mapeados mostra que as pessoas estão animadas com a política?

Caio Tendolini Nosso mapeamento não se propõe a medir a confiança e ânimo dos cidadãos com a política, mas sim a identificar iniciativas que apresentam possibilidades e soluções para a crise política que vivemos. O que percebemos é que enquanto a política vive uma crise inegável, algo está florescendo nas bordas da sociedade civil, com experimentos políticos variados que buscam reduzir a distância entre a sociedade civil e o poder público. Nós acreditamos que para além da crise de representatividade tão evidente que vivemos na democracia no Brasil e na América Latina, vivemos também uma crise de referências, que dificulta a percepção de que existe em curso hoje um surgimento de novas práticas ampliando o repertório de possíveis saídas para a crise política. Nosso trabalho vai no sentido de jogar luz nesses experimentos, apostando que deles sairão novas perspectivas para a democracia na região.

Alguns projetos de participação direta, como o da Argentina, não tornam a figura do político obsoleta?

Caio Tendolini O DemocracyOS é um aplicativo que replica a dinâmica de debate e votação na câmara dos vereadores para permitir a participação dos cidadãos. E ele é um software livre que hoje é utilizado em 17 cidades do mundo. O Partido de la Red, na Argentina, o utiliza partindo de uma premissa radical de democracia participativa que beira a democracia direta, onde qualquer cidadão pode votar nos assuntos da câmara, e o resultado coletivo se transforma automaticamente no voto do parlamentar. Em São Paulo, o vereador Ricardo Young (RedeSP) também utiliza o software, mas como uma consulta para balizar sua votação, e não para determinar o seu voto automaticamente. Ao conversar com os participantes do Partido de la Red, perguntamos: ‘O que aconteceria se você, como vereador eleito, tivesse que votar contra algo que você acredita, pois essa é a vontade dos participantes?’. A resposta deles está na aposta de que o processo digital tem que ser acompanhado de um processo de discussão qualificada na base do partido antes das votações pelo aplicativo. Ainda sobre essa premissa de democracia radical, eles acreditam que a democracia representativa é insuficiente para as dinâmicas da sociedade no século 21, e que é por meio da participação constante dos cidadãos no exercício do poder que esse gargalo pode ser sanado.

Como o Brasil aparece nesse mosaico, em relação aos outros países?

Caio Tendolini Nosso mapeamento identificou cerca de 700 iniciativas em 20 países da América Latina. O país mais representado é o Brasil, com ⅓ das iniciativas mapeadas. Em seguida, estão México, Argentina e Chile, que somam outro ⅓. O Brasil tem uma quantidade e variedade enormes de iniciativas dentro desse ecossistema, que estão pulverizadas entre as diferentes temáticas que nós mapeamos: participação cidadã (17,3%), transparência e accountability (14,3%), controle social (9,5%), comunicação independente (11,3%), inovação pública (23,6%) e cultura política (24%). Um dado relevante, que não se aplica apenas ao Brasil, está relacionado à categorização de propósito que criamos. Identificamos dois grandes propósitos das iniciativas no ecossistema: o empoderamento (cujo foco é o cidadão) e a incidência (cujo foco são as instituições). A partir disso observamos que cerca de 70% das iniciativas mapeadas tem como foco o cidadão, enquanto apenas 30% estão ligadas à incidência nas instituições políticas. Ou seja, isso nos comprova que há um descompasso entre a efervescência da sociedade civil e a permeabilidade do sistema político.

Qual o objetivo da plataforma em si? Ela foi construída pensando em que perfil de usuário?

Caio Tendolini A plataforma tem dois objetivos centrais. Por um lado organizar informações e fazer uma provocação aos atores e iniciativas que trabalham a inovação política, mostrando que eles fazem parte do mesmo ecossistema e buscando maior reconhecimento entre pares. Nesse sentido, o público focado são pesquisadores, acadêmicos, gestores públicos, candidatos, políticos, empreendedores cívicos, sociedade civil organizada e ativistas. Por outro lado, é voltada para o público geral, com o objetivo de divulgar a variedade de iniciativas que hoje atuam na redução da distância entre sociedade e poder público.

Quem são os financiadores do mapeamento?

Caio Tendolini O mapeamento foi financiado por seis organizações: Fundação Avina, Open Society Foundations, Porticus, Instituto Arapyaú, Fundação Bemtevi e pelo Instituto PDR.

ObservatórioSocial de Niterói

Organização apolítica e apartidária sem fins lucrativos que, por meio do monitoramento das contas públicas visa otimização da gestão pública…


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